A palavra Deus, para mim, é nada mais que a expressão e produto da fraqueza humana; a Bíblia, uma coleção de lendas honradas, mas ainda assim primitivas, que são bastante infantis.

— Albert Einstein

terça-feira, 26 de abril de 2011

Estarão as civilizações galácticas em ilhas isoladas de um vasto oceano interestelar?


Allen Telescope Array, Califórnia
Allen Telescope Array (ATA), Califórnia: O sistema de radiotelescópios ATA entrou em operação em setembro de 2008 e foi testado pelo SETI no dia 10/09 quando foi apontado para a sonda New Horizons (que está a caminho de Plutão) e capturou seu sinal de rádio com sucesso.
Dr. Seth Shostak, astrônomo e líder do programa de procura por vida extraterrestre inteligente, o SETI (Search for Extraterrestrial Intelligence), falou aqui sobre a impossibilidade de existir um “império galáctico” e as formidáveis dificuldades de contato entre as possíveis civilizações inteligentes da galáxia. Vamos ver a seguir o que pensa Dr. Seth sobre esse tema…
Seth Shostak do programa SETI
Seth Shostak do programa SETI

O Universo é propenso a ter vida?

Durante anos os cientistas lutaram contra um fato enigmático: o Universo parece ser extraordinariamente adequado para a presença da vida. As suas propriedades físicas estão perfeitamente ajustadas de modo a permitir a nossa existência. Estrelas, planetas e o tipo ‘grudento’ de química que produz peixes, plantas e seres humanos, tudo isto seria impossível se algumas das constantes cósmicas fossem apenas ligeiramente diferentes.

Mundos isolados

Por outro lado, existe outra propriedade cosmológica igualmente importante: o Universo está construído de tal maneira que mantém o isolamento entre os mundos.
Aprendemos esta lição há pouco tempo. A grande descoberta aconteceu em 1838 quando Friedrich Bessel venceu os seus colegas, ávidos observadores via telescópicos, e tornou-se o primeiro astrônomo a medir a distância da Terra a uma estrela, diferente do Sol. 61 Cygni, um sistema binário na nossa vizinhança, dista de nós em torno de 11 anos-luz. Para aqueles que são adeptos de modelos para comparação, pense desta forma: se encolhêssemos o Sol até o tamanho de uma bola de tênis de mesa e a colocássemos no tanque principal do Oceanário do Parque das Nações em Lisboa, 61 Cygni seria outra bola ligeiramente menor perto de Gotemburgo, na Suécia.
As distâncias entre estrelas adjacentes são medidas à escala de dezenas de bilhões de quilômetros. As distâncias entre civilizações adjacentes, mesmo assumindo que existem muitas por aí, são medidas à escala de milhares de bilhões de quilômetros – centenas de anos-luz, para usar uma unidade mais fácil de entender. Note que este número não muda muito se considerarmos o número estimado de planetas com civilizações extraterrestres que pensamos que existam – a distância de separação é praticamente a mesma se achamos que existam dezenas de milhares de sociedades galácticas ou um milhão na nossa galáxia…

Viagens interestelares relativísticas?

As distâncias interestelares são enormes, gigantescas. Se a física do Universo tivesse sido diferente – exemplo: se a constante gravitacional fosse menor – talvez as estrelas tivessem nascido bem mais perto umas das outras, e uma viagem até aos nossos vizinhos interestelares não teria seria nada mais que uma entediante boléia de foguete, como um vôo transcontinental a bordo de um avião. Para viajar de uma estrela para outra estrela próxima à velocidade dos nossos melhores foguetes demoraria algo da ordem de 100.000 anos. Para qualquer civilização extraterrestre que tivesse conseguido armazenar quantidades tão gigantescas de energia e proteger-se devidamente contra a radiação, requisito absolutamente necessário para um vôo espacial relativista, o tempo de viagem ainda assim seria medido em anos (se não para os intrépidos viajantes, mas para aqueles que eles deixassem para trás à seus comandantes).

O legado dos Romanos

O Império Romano em 117 DC atingiu sua extensão máxima (5.900.000 km²), após a conquista da Dácia, pelo imperador Trajano.
O Império Romano em 117 DC atingiu sua extensão máxima (5.900.000 km²), após a conquista da Dácia, pelo imperador Trajano.
Isto tem algumas conseqüências óbvias (que, extraordinariamente, sempre escaparam à atenção da maioria dos escritores de Hollywood). Para começar, é melhor esquecer “impérios” galácticos ou o termo agora politicamente-correto: “federações”. Há dois mil anos, os Romanos ergueram um império que se estendia desde a Península Ibérica até ao Iraque, com um raio de cerca de 2.000 km. Os Romanos conseguiram esta conquista extraordinária graças à sua excelente organização logística e ao desenvolvimento da engenharia civil. Todas aquelas estradas do império (para não falar do uso do Mediterrâneo) permitiram-lhes mover as suas tropas a alguns quilômetros por hora. Até os mais ermos cantos do Império Romano poderiam ser alcançados em alguns meses ou menos, ou melhor, até cerca de 1% do tempo de vida do legionário comum (digamos: cerca de 30 anos). Fazia sentido, na época, levar a cabo campanhas desenhadas para manter coesa uma complexa e extensa estrutura social, uma vez que para atingir quaisquer partes do império era necessário até o máximo de 1% de uma vida (vamos fixar isto aqui: 1% de 30 anos ≈ 4 meses de viagem).
A expansão e declinio do Império Romano.
A expansão e declinio do Império Romano.

O que é raio de controle de comando?

No século XIX, os barcos a vapor e as estradas de ferro aumentaram as velocidades de deslocamento dos exércitos por um fator de dez, o que estendeu o raio de controle de comando (a distância máxima na qual o comando central consegue administrar um vasto império ou federação) por um valor similar. Assim, com essa infraestrutura, os ingleses conseguiram governar e manter a hegemonia do império britânico controlando colônias espalhadas pelo globo terrestre.

Como construir ‘federações galácticas’ e manter o controle de comando?

Mas aqui, quando falamos de distâncias galácticas, é que o assunto muda radicalmente de figura.  Mesmo que conseguíssemos mover pessoas e recursos quase que à velocidade da luz (uma capacidade impossível, tanto agora quanto para se atingir em futuro próximo), esta “regra de 1% da vida” ainda limitaria a nossa capacidade de intervir efetivamente – o nosso raio de controle de comando – a distâncias inferiores a um ano-luz (na verdade: 4 meses-luz, para sermos fiel ao modelo sugerido acima). Mas, 4 meses-luz é consideravelmente muito menor – um décimo – que a distância entre o Sol e a sua estrela mais próxima (a anã-vermelha Próxima Centauri, que fica a ≈ 4,22 anos-luz da Terra). Conseqüentemente, a suposta “Federação Galáctica” será sempre apenas uma bela ficção (como se já não soubéssemos disso…). Sendo assim, por exemplo, mesmo que fossemos avisados (uma capacidade de comunicação também impossível de ser atingida como veremos abaixo) que uma civilização extraterrestre belicosa estaria prestes a disseminar o caos e a destruição em nossas colônias no Braço Galáctico de Perseus, não poderíamos reagir rápido o suficiente para mudar o resultado do conflito. E as nossas tropas locais de resistência há muito que já teriam sido dizimadas antes que o reforço da federação alcançasse as linhas da frente do combate.
Em outras palavras, quaisquer formas de vida inteligente extraterrestre que possam existir por aí muito provavelmente não chegarão a tomar conhecimento sobre a existência de outras.

Capacidade limitada de comunicação

Um argumento semelhante e ainda mais forte pode ser aplicado às capacidades de comunicação dentro de um império de larga escala. As trocas de informação no passado demoravam vários meses (uma carta por mar, por exemplo). Genericamente falando, regularmente começamos qualquer projeto de grande porte bem-definido com a duração de mais que duas ou três gerações. Os construtores de catedrais medievais estavam dispostos a gastar esse tempo para completar os seus edifícios góticos. Aqueles que enterram “cápsulas do tempo” estão ocasionalmente dispostos a deixar passar séculos antes que os seus conteúdos sejam desenterrados. Mas, então o que dizer de um projeto que demore vários séculos, ou até milênios? Quem afinal é que está disposto a fazer tal empreitada?
Epsilon Eridani b
Epsilon Eridani b
Exemplificando: vejamos aqui um cenário para mostrar a importância da comunicação. Vamos supor que nós terráqueos consigamos estabelecer em Epsilon Eridani, uma estrela irmã jovem do Sol, uma anã-laranja da classe K, que dista apenas 10,5 anos-luz da Terra, uma colônia promissora. A colônia consegue se estabelecer com sucesso e reporta a Terra periodicamente os relatórios e notícias sobre os fatos relevantes. As informações levam 10 anos e meio (!) para chegar a Terra, mas o processo unidirecional de envio de dados pelo espaço tem funcionado com sucesso. Assim, suponhamos que algum tempo depois ocorra um problema gravíssimo com os simpáticos colonos que para solucionar a colônia necessite de uma intervenção da Terra… a solicitação de ajuda levará 10 anos e meio para chegar ao governo na Terra. Como ajudar nossos companheiros em Epsilon Eridani, então? Impossível!  E se por outro lado a colônia decidir ‘se rebelar’ e cortar as comunicações com o governo da Terra? O governo ‘imperial central’ levará 10 ½ anos para notar a falta de comunicação e mais algumas décadas para descobrir o que aconteceu (uma tragédia repentina? uma extinção em massa? o que houve afinal?), reagir e ‘retomar o poder’.
Chegamos aqui a uma conclusão incontestável: um controle imperial galáctico humano ou uma federação multi-estelar de terráqueos será sempre impossível tecnicamente. Se a colonização e exploração de outros sistemas solares se tornar realidade no futuro, cada sistema terá seu governo próprio e independente sem qualquer vínculo com os governos de outros sistemas. Governar  e controlar efetivamente só será viável dentro do seu próprio sistema solar.

Busca por sinais da vida inteligente extraterrestre (SETI)

Claramente, estas simples observações têm que ter implicações para organizações que se dedicam à pesquisa de sinais de vida inteligente no espaço, como o famoso programa de procura por vida extraterrestre inteligente, o SETI (Search for Extraterrestrial Intelligence). O programa SETI busca identificar e processar supostas transmissões que vêm de fora do nosso sistema Solar. Essas mensagens de civilizações extraterrestres terão que viajar durante centenas ou milhares de anos para chegar até nós. Em particular, se existirem sinais a serem espalhados pela Galáxia com os mesmos propósitos que o SETI (entrar em contato), então:
  1. Estes extraterrestres têm uma esperança de vida muito maior que a nossa, o que (se você é um fã da inteligência artificial) implica o fato de provavelmente não serem biológicos.
  2. Ainda nos faltam conhecimentos importantes de Física, que nos permitiriam comunicar mais rapidamente que a luz, e estes esforços de comunicação extraterrestre não incluem o envio de luz ou ondas de rádio pelo espaço, mas algo bastante mais poderoso e avançado tecnologicamente, algo que a nossa civilização não consegue [ainda (?)] receber.
Muitos leitores irão, talvez num sentido de perversidade afetiva, escolher a segunda hipótese. Talvez tenham razão, mas isso desafia tudo o que sabemos sobre Física. Além disso, o que sabemos contraria frontalmente algo digno de se falar em um jantar entre amigos – algo simples como: as escalas de tempo para as viagens e comunicações interestelares são imensamente longas para uma fácil (e viável) interação entre seres cujo tempo de vida deve ser como o nosso, de apenas um século ou menos. Por isso, enquanto o Cosmos pode facilmente estar polvilhado de vida inteligente – como nos indica a arquitetura universal e não uma fictícia “Diretiva Federal Universal” (como em ‘Star-Trek’ – ‘Jornada nas Estrelas’) para assegurar uma preciosa e diminuta interferência entre uma cultura e outra(s).

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