O nosso cérebro e o nosso sistema nervoso constituem uma máquina geradora de crenças, um sistema que evolui não para garantir a verdade, a lógica e a razão, mas a sobrevivência. A máquina de crenças tem sete peças básicas.
Muitas pessoas creem nas ideias a seguir. Todas elas já foram calorosamente debatidas:
- Através da hipnose pode-se conhecer vidas passadas
- Horóscopos fornecem informações úteis sobre o futuro
- Às vezes acontecem curas espirituais onde a medicina convencional falha
- Está em andamento uma ampla conspiração satânica transgeracional na sociedade
- Algumas pessoas com dons especiais podem usar seus poderes extra-sensoriais para ajudar a polícia a desvendar crimes
- Às vezes nos comunicamos com outras pessoas telepaticamente
- Algumas pessoas foram raptadas por OVNIs e voltaram à Terra
- Elvis está vivo
- Vitamina C cura ou previne resfriados
- Imigrantes estão roubando os nossos empregos
- Alguns grupos étnicos são intelectualmente inferiores
- Alguns grupos étnicos são superiores atleticamente, pelo menos em alguns esportes
- Crime e violência estão ligados à ruptura da família tradicional
- O crescente poderio atômico da Coreia do Norte é uma ameaça à paz mundial
Os racionalistas do século dezenove previram que a superstição e a irracionalidade seriam derrotadas pela educação universal. Mas não foi isso que aconteceu. As altas taxas de alfabetização e a educação universal pouco fizeram para suavizar essa crença, e pesquisas atrás de pesquisas mostram que a imensa maioria da população acredita na realidade dos fenômenos “ocultos”, “paranormais” ou “sobrenaturais”. E por que isso acontece? Por que é que nesta época altamente científica e tecnológica a superstição e a irracionalidade prosperam?
É porque nosso cérebro e nosso sistema nervoso constituem uma máquina geradora de crenças, uma máquina que produz crenças sem qualquer consideração em particular por o que é real e verdadeiro e o que não é. Essa máquina de crenças seleciona informações do ambiente, molda-as, combina-as com informações armazenadas na memória e produz crenças que são geralmente consistentes com outras crenças já aceitas. Esse sistema gera crenças falaciosas da mesma maneira que aquelas em dia com a verdade. Essas crenças guiam ações futuras e, falsas ou não, podem ter utilidade para o seu portador. Se existe de fato ou não um céu para boas almas em nada diminui a utilidade dessas crenças para pessoas que procuram um sentido na vida.
Nada é fundamentalmente diferente sobre o que podemos pensar como crenças “irracionais” — elas são geradas da mesma maneira que as outras. Podemos não ter apoio das evidências para crenças em ideias irracionais, mas também não temos esse apoio para a maior parte das nossas crenças. Por exemplo, você provavelmente acredita que escovar os dentes é bom para você, mas provavelmente não tem nenhuma evidência para apoiar essa crença, a menos que seja dentista. Ensinaram-lhe isso e, por fazer sentido, você nunca questionou a ideia.
Se fôssemos conceituar o cérebro e o sistema nervoso como uma máquina de crenças, ela compreenderia diversas partes, cada uma refletindo um aspecto básico da geração de crenças. Entre as peças, as seguintes unidades têm importância especial:
- A unidade de aprendizado
- A unidade de pensamento crítico
- A unidade dos desejos
- A unidade de entrada
- A unidade de resposta emocional
- A unidade de memória
- A unidade de feedback (resposta) ao ambiente
A Unidade de Aprendizado
A unidade de aprendizado é a chave para a compreensão da máquina de crenças. Ela está ligada à arquitetura física do cérebro e do sistema nervoso, e devido à sua natureza, estamos condenados a um processo virtualmente automático de pensamento mágico. “Pensamento mágico” é a interpretação de dois eventos próximos como sendo causa e efeito, sem nenhuma preocupação com o vínculo causal. Por exemplo, se você acredita que cruzar os dedos dá boa sorte, você associa o fato de cruzar os dedos com um subsequente evento favorável e estabelece um vínculo causal entre eles.Nosso cérebro e nosso sistema nervoso evoluíram ao longo de milhões de anos. É importante perceber que a seleção natural não seleciona diretamente de acordo com a razão ou a verdade, ela seleciona de acordo com o sucesso reprodutivo. Nada em nosso aparelho cerebral dá um valor especial à verdade. Imagine um coelho na grama alta, e lhe conceda por um instante um grão de intelecto consciente e lógico. Ele ouve um ruído suave na grama, e tendo aprendido no passado que isso eventualmente é o sinal de uma raposa com fome, o coelho se pergunta se é uma raposa mesmo desta vez ou se uma lufada de ar causou o ruído. Ele espera por evidências mais conclusivas. Embora motivado pela busca da verdade, esse coelho não sobrevive por muito tempo. Compare esse falecido coelho com um outro, que responde ao ruído com uma forte reação do sistema nervoso autônomo e foge o mais rapidamente possível. Este tem mais chances de sobreviver e se reproduzir. Portanto, buscar a verdade nem sempre favorece a sobrevivência, e fugir baseado em uma crença errônea nem sempre é ruim. No entanto, embora essa estratégia possa dar certo na vida selvagem, pode ser bastante perigosa na era nuclear.
A unidade de aprendizado é tal que se aprende muito rapidamente pela associação de dois eventos significativos — como encostar em um forno quente e sentir dor. Associações significativas produzem um efeito duradouro, enquanto a dissociação dos mesmos eventos é muito menos importante. Se uma criança encostasse em um forno e se queimasse, e depois se encostasse de novo e não se queimasse, a associação entre dor e forno não seria automaticamente desaprendida. Essa assimetria básica — a associação de dois estímulos tem um efeito importante, enquanto que apresentar os estímulos desassociados (ou seja, individualmente) tem um efeito muito menor — é importante para a sobrevivência.
Essa assimetria no aprendizado também está subjacente ao erro que tinge nossos pensamentos sobre eventos que ocorrem juntos de tempos em tempos. Os humanos são muito ruins em julgar com precisão a relação entre eventos que só ocorrem juntos de vez em quando. Por exemplo, se pensamos no tio Alfredo e ele nos telefona alguns minutos depois, pode parecer que isso exige uma explicação em termos de telepatia ou precognição. No entanto, só podemos avaliar adequadamente as co-ocorrências desses eventos se também considerarmos o número de vezes que pensamos no tio Alfredo e ele não ligou, ou no número de vezes em que não pensamos mas ele ligou mesmo assim. Essas últimas circunstâncias — esses não-pareamentos — têm muito pouco impacto no nosso sistema de aprendizado. Por sermos superinfluenciados pelos pareamentos de acontecimentos significativos, inferimos uma associação entre os eventos, até mesmo causal, mesmo quando não há nenhuma. Assim, por acaso alguns sonhos podem corresponder aos eventos subsequentes muito raramente, e mesmo assim essa conexão pode ter um efeito dramático na crença. Ou sentimos que está vindo um resfriado, tomamos vitamina C, e quando se percebe que o resfriado não era tão forte inferimos uma conexão causal. O mundo à nossa volta está repleto de acontecimentos coincidentes. Alguns deles têm significado, mas a vasta maioria não tem. Isso fornece solo fértil para o crescimento de crenças falaciosas. Nós aprendemos prontamente que existem associações entre eventos, mesmo quando elas não existem. Frequentemente somos levados por eventos co-ocorrentes a inferir que o primeiro deles de alguma maneira causou o que o sucedeu.
Temos tendência ainda maior ao erro quando estão envolvidos eventos raros ou emocionalmente carregados. Sempre estamos procurando por explicações causais, e tendemos a inferi-las mesmo quando não existem. Você poderia ficar intrigado ou até mesmo muito incomodado se ouvisse um barulho alto na sua sala mas não encontrasse nenhum motivo para ele.
A Unidade de Pensamento Crítico
A unidade de pensamento crítico é o segundo componente da máquina de crenças, e é adquirida — adquirida através da experiência e do aprendizado explícito. Devido à arquitetura do sistema nervoso que descrevi, nós nascemos para pensar magicamente. A criança que sorri logo antes de o vento mover o móbile acima dela sorrirá novamente muitas vezes como se o sorriso tivesse magicamente causado o movimento desejado do móbile. Precisamos trabalhar para superar essa predisposição mágica, e nunca o conseguimos por completo. É pela experiência e ensino direto que entendemos os limites de nossas interpretações intuitivas mágicas imediatas. Pais e professores nos ensinam a lógica, e uma vez que ela nos ajuda bastante, a usamos quando parece apropriado. De fato, o paralelo cultural desse processo de desenvolvimento é o progresso do método formal de investigação lógica e científica. Percebemos que não podemos confiar em nossas inferências automáticas sobre co-ocorrências e causalidade.Aprendemos a usar testes simples de razão para avaliar eventos à nossa volta, mas também aprendemos que certas classes de eventos não devem ser sujeitas à razão, mas aceitas por fé. Toda sociedade ensina coisas transcendentais — fantasmas, deuses, bicho-papão e assim por diante; e frequentemente nos dizem explicitamente para ignorar a lógica e aceitar tais coisas por fé ou baseados nas experiências de outras pessoas. Quando chegamos à vida adulta, podemos responder a um evento de forma lógica e crítica ou experimental e intuitiva. Os eventos em si é que frequentemente determinam como respondemos. Se eu lhe dissesse que fui para casa ontem e encontrei um hipopótamo na minha sala, seria mais provável que você risse do que acreditasse em mim, embora certamente não haja nada de impossível nesse evento. Se, por outro lado, eu lhe dissesse que entrei na sala e me assustei com um brilho estranho na cadeira do meu falecido avô, e que a sala esfriou, seria menos provável que você não acreditasse e mais provável que se interessasse e escutasse os detalhes, talvez suspendendo o julgamento afiado que usaria na história do hipopótamo. Às vezes emoções fortes interferem na aplicação do pensamento crítico. Em outras somos enganados com muita esperteza.
A racionalidade frequentemente está em desvantagem em relação ao pensamento intuitivo. O falecido psicólogo Graham Reed usava o exemplo da falácia do apostador: suponha que você esteja observando um jogo de roleta. Saiu preto dez vezes seguidas, e uma poderosa sensação intuitiva cresce em você, dizendo que logo deve sair vermelho. Não pode sair preto para sempre. Mas sua mente racional diz que a roleta não tem memória, que cada resultado é independente dos anteriores. Nesse caso, a luta entre intuição e racionalidade nem sempre é ganha pela racionalidade.
Notem que podemos ligar ou desligar a unidade de pensamento crítico. Como já comentei, podemos desligá-la completamente ao lidar com assuntos religiosos ou transcendentais. Às vezes, nós a ligamos deliberadamente: “peraí, tenho que pensar nisso”, é o que podemos nos dizer quando alguém tenta tirar dinheiro de nós por uma causa aparentemente boa.
A Unidade do Desejo
O aprendizado não acontece num vácuo. Nós não somos receptores passivos de informação. Nós buscamos informações ativamente para satisfazer nossas necessidades diversas. Podemos desejar achar um sentido na vida. Podemos desejar um sentimento de identidade. Podemos desejar nos curar de alguma doença. Podemos desejar estar em contato com entes queridos que já morreram.Geralmente nós desejamos para diminuir nossa ansiedade. As crenças, sejam falsas ou não, podem suavizar esses desejos. Frequentemente, crenças que podem ser chamadas de irracionais pelos cientistas são as mais eficientes na suavização desses desejos. A racionalidade e a verdade científica tem pouco a oferecer para a maior parte das pessoas em termos de remediar suas ânsias existenciais. No entanto, as crenças em reencarnação, intervenção supernatural e vida eterna podem superar essa ansiedade em certo grau.
Quando mais desejamos, quando estamos com mais necessidade é que somos mais vulneráveis a crenças falaciosas que podem servir para satisfazer aqueles desejos.
A Unidade de Entrada
As informações entram na máquina de crenças às vezes na forma de experiências sensoriais diretas e às vezes na forma de informações codificadas e organizadas que se ouve no boca-a-boca, se lê em livros ou se vê em filmes. Nós somos ótimos para detectar padrões, mas nem todos os padrões que detectamos têm sentido. Nossos processos de percepção trabalham para dar sentido ao ambiente à nossa volta, mas eles fazem sentido — percepção não é a reunião passiva de informações, mas a construção ativa da representação do que acontece no nosso mundo sensorial. Nosso aparato perceptivo seleciona e organiza informações do ambiente, e esse processo está sujeito a muitos tipos de viés bem conhecidos que podem levar a crenças distorcidas. De fato, somos menos influenciáveis por informações que já não correspondam a crenças profundas. Assim, o devoto cristão pode estar muito bem preparado para ver a Virgem Maria; informações ou experiências perceptivas que sugerem que ela apareceu podem ser aceitas mais facilmente sem exame crítico do que por alguém que fosse ateísta. Similarmente acontece com experiências que podem ser consideradas de natureza paranormal.A Unidade de Resposta Emocional
Experiências acompanhadas de fortes emoções podem deixar uma crença inabalável em qualquer explicação que o indivíduo tenha recebido na época dos fatos. Se alguém está envolvido em um aparente caso de telepatia ou OVNI, então os pensamentos posteriores podem muito bem ser dominados pela consciência de que a reação emocional foi intensa, levando à conclusão de que alguma coisa incomum realmente aconteceu. E as emoções por sua vez podem afetar diretamente tanto a percepção como o aprendizado. Algumas coisas podem ser interpretadas como bizarras ou incomuns devido às respostas emocionais que elas desencadeiam.Há crescentes evidências de que nossas respostas emocionais podem ser desencadeadas por informações do mundo exterior mesmo antes de termos consciência de que algo aconteceu. Veja esse exemplo, exposto por LeDoux (1994) em seu recente artigo na Scientific American (1994, 270, pp. 50-57):
Uma mulher está caminhando na floresta quando recebe a informação — auditiva, como o farfalhar de folhas, ou visual, como a forma de um objeto delgado e curvo no chão — que dispara uma reação de medo. Essa informação, mesmo antes de chegar ao córtex, é processada na amígdala, que excita o corpo para um passo de alarme. Um pouco depois, quando o córtex já teve tempo suficiente para decidir se o objeto é mesmo uma cobra ou não, esse processamento cognitivo de informação aumentará a resposta de medo e o correspondente comportamento de fuga, ou neutralizará aquela resposta.
Isso é relevante para o entendimento das experiências paranormais, pois frequentemente uma experiência emocional acompanha a suposta experiência paranormal. Uma forte coincidência pode produzir um “zap” emocional que aponta para uma explicação paranormal, porque eventos normais não produziriam tal emoção.
Nossos cérebros também são capazes de gerar incríveis e fantásticas experiências perceptivas para as quais raramente estamos preparados. Experiências fora do corpo (Out of Body Experiences — OBEs), alucinações, experiências de quase-morte (EQMs ou Near-death Experiences — NDEs), experiências de pico — todas elas provavelmente se baseiam não em alguma realidade externa transcendental mas no próprio cérebro. Nem sempre conseguimos distinguir o material que vem do próprio cérebro do material que vem do mundo externo, e portanto podemos atribuir falsamente ao mundo externo as percepções e experiências criadas dentro do cérebro. Temos muito pouco treinamento em relação a essas experiências. Na infância, aprendemos a não confiar, via de regra, em sonhos e pesadelos. Nossos pais e nossa cultura nos dizem que eles são produto de nossos cérebros. Não estamos preparados para experiências mais misteriosas, como OBEs, alucinações, EQMs ou experiências de pico, e podemos estar tão despreparados que somos engolfados pela emoção e a vemos como profundamente significativa e “real” quer ela seja mesmo ou não.
Ray Hyman sempre lembrou aos céticos que não se surpreendessem caso um dia tivessem uma experiência emocional muito forte que parecesse exigir uma explicação paranormal. Dada a maneira com que nossos cérebros funcionam, deve-se esperar tais experiências de tempos em tempos. Se estivermos despreparados, elas podem se tornar experiências de conversão que levam a fortes crenças. Quando eu estava na faculdade, certo dia um colega com quem eu dividia meu escritório e que era tão cético quanto eu em relação ao paranormal, veio para a aula dominado pelo realismo e clareza de um sonho que ele tivera na noite anterior. No sonho, seu tio em Connecticut havia morrido. Tinha sido um sonho muito emocional, e era tão chocante que Jack me contou que se o seu tio morresse pouco depois daquilo, ele não conseguiria mais manter seu ceticismo sobre precognição. A experiência do sonho tinha sido realmente poderosa. Dez anos depois, o seu tio ainda estava vivo, e o ceticismo de Jack sobreviveu intacto.
A Unidade de Memória
Em virtude de nossas próprias experiências, acreditamos na confiabilidade de nossa memória e em nossa capacidade de julgar se uma lembrança é confiável ou não. Contudo, a memória é mais um processo construtivo que uma apresentação literal de experiências passadas, e as memórias estão sujeitas a um forte viés e distorções.A memória não somente envolve a si mesma no processamento das informações que chegam e na moldagem de crenças; ela própria também é fortemente influenciada pelas percepções e crenças correntes. Ainda assim, é muito difícil que um indivíduo rejeite os produtos de sua própria memória, já que a memória pode parecer tão “real”.
A Unidade de Feedback (Resposta) ao Ambiente
As crenças nos ajudam a funcionar. Elas guiam nossas ações e aumentam ou reduzem nossas ansiedades. Se agimos a partir de uma crença e ela “funciona” para nós, mesmo sendo falsa, por que a mudaríamos? O feedback, ou retorno, do mundo externo reforça ou enfraquece nossas crenças, mas já que as crenças em si influenciam como o feedback é percebido, as crenças podem se tornar bastante resistentes a informações e experiências contrárias. Se você realmente acredita que ETs raptam pessoas, então qualquer evidência contrária pode ser mascarada por uma explicação supostamente racional — em termos de teorias conspiratórias, ignorância alheia ou o que for.Como mencionei, crenças falaciosas frequentemente podem ter mais valor funcional que aquelas baseadas na verdade. Por exemplo, Shelley Taylor, em seu livro Positive Illusions, relata pesquisas que mostram que pessoas suavemente deprimidas frequentemente são mais realistas a respeito do mundo do que pessoas felizes. Pessoas emocionalmente saudáveis vivem, até certo ponto, construindo crenças falsas — ilusões — que reduzem a ansiedade e auxiliam o bem-estar, enquanto indivíduos deprimidos em certo grau veem o mundo com mais realismo. Pessoas felizes talvez subestimem as chances de contraírem câncer ou serem mortas, e talvez evitem pensar na realidade última da morte, enquanto pessoas deprimidas podem ser muito mais realistas em relação a essas questões.
Uma maneira importante de checar nossas crenças e percepções é compará-las com as crenças e percepções de outros. Se eu sou o único que interpretou o brilho estranho como uma aparição, é mais provável que eu reconsidere essa interpretação do que se várias outras pessoas tiverem a mesma impressão. Nós frequentemente procuramos pessoas que concordam conosco, ou escolhemos livros seletivamente para apoiar nossas crenças. Se a maioria duvida de nós, então mesmo sendo somente parte de uma minoria nós podemos trabalhar coletivamente para dissipar a dúvida e achar a certeza. Podemos invocar conspirações e casos abafados para explicar a ausência de evidências confirmatórias. Podemos conseguir inculcar nossas crenças em outros, especialmente crianças. Crenças comuns podem promover solidariedade social e até uma sensação de importância para o indivíduo e o grupo.
Conclusão
As crenças são geradas pela máquina de crenças sem qualquer preocupação automática pela verdade. A preocupação com a verdade é de uma orientação cognitiva adquirida de ordem superior que reflete uma filosofia subjacente que pressupõe uma realidade objetiva que nem sempre é percebida por nossos sentidos.A máquina de crenças segue fazendo barulho, reforçando velhas crenças, cuspindo novas, raramente descartando alguma. Às vezes vemos os erros ou bobagens nas crenças de outros. Mas é muito difícil ver o mesmo em nossas próprias crenças. Acreditamos em todo tipo de coisas, abstratas e concretas: na existência do sistema solar, de átomos, pizzas e restaurantes cinco estrelas em Paris. Essas crenças não são diferentes em princípio das crenças em fadas na beira do jardim, em fantasmas em igrejas desertas, em lobisomens, conspirações satânicas, curas milagrosas e assim por diante. Todas elas são similares na forma, todas resultados do mesmo processo, apesar de diferirem muito em conteúdo. Elas podem, contudo, envolver mais ou menos as unidades de pensamento crítico e de resposta emocional.
Pensamento crítico, lógica, razão, ciência — essas são expressões que se aplicam de uma maneira ou de outra à tentativa deliberada de expulsar a verdade da confusão da intuição, percepção distorcida e da memória falível. O verdadeiro pensamento crítico poucas pessoas chegam a aceitar — aquele que não aceita rotineiramente as percepções e memórias. Criações da nossa imaginação e reflexos de nossas necessidades emocionais frequentemente interferem com ou suplantam a percepção da verdade e realidade. Ensinando e encorajando o pensamento crítico nossa sociedade se afastará da irracionalidade, mas nunca teremos sucesso completo em abandonar tendências irracionais devido à natureza básica da máquina de crenças.
A experiência frequentemente é uma ferramenta pobre na busca da realidade. O ceticismo nos ajuda a questionar nossas experiências e a evitar sermos levados a crer no que não é verdadeiro. Devemos tentar nos lembrar das palavras no falecido P. J. Bailey (em Festus: A Country Town): “Onde há dúvida, está a verdade — pois é sua sombra” (“Where doubt, there truth is — ‘tis her shadow”).
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